Durante
o movimento grevista dos servidores estaduais da educação, principalmente
próximo de seu final, o Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Estado do
Pará – SINTEPP
sempre buscou negociação com o Estado, inclusive no que se refere
a reposição das aulas sem o correspondente desconto dos dias parados.
A
IN 01/2015 apresenta-se impraticável, desestimulante e
antipedagógica. Além de ser ilegal e, mais grave, coloca em risco o ano letivo
de 2015, conforme abaixo demonstrado.
Da necessidade constitucional de participação do
sindicato no processo de reposição de aulas.
O
Sintepp poderia deixar por conta exclusiva do Estado, através da Seduc, a execução
da reposição das aulas em decorrência da greve dos servidores. E assim não
tomaria para si qualquer parcela da responsabilidade pelo o caos que,
certamente, se instalará na educação do Pará em decorrência das equivocadas previsões
contidas na IN 01/2015.
Contudo,
não é essa a intenção do sindicato. Mas, fazer valer sua prerrogativa
constitucional de participar de questões que envolvam interesses e direitos da
categoria que defende, além da busca por uma educação pública de qualidade.
Sabe-se
que o direito de sindicalização ao servidor público no Brasil foi inaugurado
com a atual Constituição Federal, expresso no inciso VI, do art. 37. E com
isso, absorveu os demais direitos e garantias decorrentes do sistema sindical
previsto em dispositivos constitucionais e infraconstitucionais, dos quais se destacam,
na Constituição Federal, o direito/dever de atuar na “defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria,
inclusive em questões judiciais ou administrativas” (art. 8º, III); sendo “obrigatória
a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho” (art.
8º, VI).
No campo infraconstitucional, destacam-se as determinações da Lei n° 5.810/1994, que dispõe sobre o Regime Jurídico
Único dos Servidores Públicos Civis do Estado do Pará, que adota diversos dispositivos relacionados ao direito
sindical, como a garantia do servidor “ser representado
pelos sindicatos, na forma da legislação processual civil” (art. 175, a); assegurando a “participação
permanente do servidor (indicado pelo sindicato) nos colegiados dos órgãos do Estado
do Pará em que seus interesses profissionais ou previdenciários sejam objeto de
discussão e deliberação” (art. 176); ficando “assegurada a participação de 1
(um) representante dos sindicatos de servidores públicos no Conselho de
Política de Cargos e Salários do Estado do Pará, na forma do regulamento”.
(art. 242).
Portanto, a participação do Sintepp nesse processo de reposição de
aulas afigura-se como um direito/dever e, inclusive, uma necessidade para o
alcance de um mínimo de resultado positivo.
Todavia, a IN 01/2015, ignorando a legitimidade e legalidade do
Sintepp, estabeleceu unilateralmente as regras gerais de reposição das aulas,
incluindo a quantidade dos dias a serem cumpridos e o período da reposição
(art. 4º), atribuindo o papel de sua discussão e elaboração do calendário a
cada unidade escolar (art. 2º).
Importante registrar que pouco adiante essa medida arbitrária e
segregadora do Estado, uma vez que o sindicato está sendo acionado com
frequência pelos professores na busca de orientações, principalmente sobre os
aspectos jurídicos da instrução. Realidade, no entanto, que não supre a sua ilegalidade
formal.
Inexequibilidade
da IN 01/2015: impossibilidade de cumprimento do período de
reposição. Desobrigação dos professores trabalharem em regime de hora extra.
De acordo com o art. 4º da Instrução, a reposição das aulas deve
corresponder a 45 dias letivos, a ser iniciada neste mês de junho em todos os
sábados e em 15 dias do mês de julho/2015.
De início, percebe-se que não será mais possível o cumprimento da IN
01/2015, uma vez que dois sábados já se passaram e não houve qualquer sinalização
positiva por parte das escolas, inclusive pela falta de discussão dos
professores sobre o suposto calendário de reposição, bem como a necessária
aprovação deste pelos conselhos escolares, o que demandaria, em média, mais
quinze dias.
Nesse contexto, destaca-se, ainda, a ausência de obrigatoriedade dos professores trabalharem em tal
reposição de aulas.
Ao promover os descontos dos dias parados dos professores, o Estado
acabou por desobrigá-los de efetuar a reposição das aulas correspondentes a
esses dias.
E essa premissa foi informada ao Estado e ao Judiciário, quando da impetração do mandado
de segurança para impedir o corte dos dias parados, sustentada através de
decisões judiciais, como a do desembargador Jose Maria Teixeira do Rosário, nos autos do
processo de nº 2013.3.031578-5, o
qual, ao negar liminar ao Sindicato dos
Servidores da Polícia Civil do Estado do Pará - Sindpol, para proibir o
desconto dos servidores da polícia civil do Estado do Pará, então em
movimento grevista, deixou expresso a
ressalva de que no caso dos servidores da educação o desconto não poderia ser
efetuado, considerando, inclusive, a possibilidade de reposição das aulas.
Outra decisão que merece destaque, de
origem do TJE, foi a proferia em 19/02/2014, pelo juiz convocado José
Roberto Bezerra Maia Junior, o qual DEFERIU, em cognição sumária, “a liminar
pleiteada para determinar que a autoridade coatora se abstenha de realizar
novos descontos na remuneração dos servidores que aderiram ao movimento
paredista relativos aos dias de greve até ulterior deliberação”. (Processo nº proc. nº 2014.3.016808-4), fazendo-se os seguintes destaques (sem grifos no
original):
(...)
Outro ponto fulcral são os deletérios efeitos que essa medida
administrativa impõe a aos alunos em geral e, por extensão, à sociedade com a
perda do calendário letivo pelos alunos, pois,
permanecendo os descontos, não poderá ser exigida a reposição de aulas,
maculando e tornando letra morta e fria toda proteção constitucional à criança
e ao adolescente e ao direito à educação consagrado na CF, além do próprio
Estatuto da Criança e do Adolescente.
Diz-se isso apenas por dever argumentativo jurídico, considerando que na
própria Instrução Normativa, não há imposição aos professores para lecionarem
em aulas de reposição.
Por outro lado, visando “atrair” os professores a ministrarem aulas
aos sábados e em julho, consta no parágrafo único do art. 3º, da IN 01/2015, que
as aulas de reposição serão remuneradas como horas extras.
Apesar de omisso na Instrução, importante ressaltar que a hora extra
deve ser remunerada em 50% da hora normal, nos termos do inciso XVI do art. 7º,
c/c § 3º do art. 39 da Constituição Federal.
No âmbito da legislação estadual referente aos servidores públicos, a
hora extra é tratada na Lei
n° 5.810/1994 (RJU dos servidores públicos).
Prevendo-a como uma gratificação (art. 132, I), considerada aquela “que exceder, por antecipação ou prorrogação, à
jornada normal diária de trabalho” (art. 133, § 2º); sendo permitida somente para “atender a situações excepcionais e temporárias,
respeitado o limite máximo de 2 (duas) horas por jornada” (art. 133, § 1º) e não “poderá exceder ao
limite de 60 (sessenta) horas mensais” (art. 133, § 3º), “salvo para os
servidores integrantes de categorias funcionais com horário diferenciados em
legislação própria” (art. 133, § 3º, final).
Nessa suposta situação, e considerando hipoteticamente a
obrigatoriedade dos professores trabalharem em regime de horas extras, não
seria possível a reposição das aulas, uma vez que não se poderia ultrapassar
duas horas por dia.
Porém, não há a figura da hora extra, no seu conceito
legal acima exposto, conferida aos professores. Não existe no Estatuto
do Magistério (Lei nº 5.351/1986, art. 31), no PCCR do magistério (Lei
nº 7.442/2010) e, tampouco, na lei que dispõe
sobre a jornada de trabalho e as aulas suplementares dos professores (Lei nº 8.030/2014).
Por seu lado, conforme preceitua o PCCR e a Lei nº
8.030/2014, além da jornada de trabalho mensal de 200 horas, pode ser atribuído
ao professor até 70 aulas suplementares, de acordo com a Portaria GS/SEDUC nº
206, de 24/04/2015, que dispõe sobre a lotação dos professores para o
ano de 2015”.
Vejam que o Estado impôs redução de aulas suplementares aos professores e
agora não poderá aumentar justamente tais aulas suplementares para servirem de
reposição dos dias de paralisação, seria demais constrangedor ao governo.
De tudo
se conclui que os professores não são obrigados a trabalharem em regime de horas
extras, principalmente aos sábados. E que também não há tempo hábil para se cumprir os
prazos estabelecidos pela própria Resolução.
No caso concreto, supondo que alguns professores se
ofereçam para ministrarem aulas e outros não, estaríamos diante de um
incompleto ano letivo, em que, a título de exemplo, se teriam aulas de história,
mas não de matemática. E eventuais contratações de professores temporários para
supririam esta lacuna não teria resultado satisfatório, pois, necessitariam dar
aulas apenas do conteúdo não dado, o que necessitaria de informações
individuais de cada professor. E tudo se levando em conta um quadro de
aproximados 28 mil professores da rede estadual de ensino.
Enfim, essa proposta de reposição de aulas é completamente
inviável. Não há pessoa neste Estado, com inteligência mediana, que acreditará
em seu mais remoto sucesso.
E levando-se em frente essa fracassada proposta de
reposição, o Estado, queira ou não, aniquilará o ano letivo de 2015. E seus
gestores deverão ser responsabilizados por esse ato de imensurável gravidade.
Walmir Brelaz
* Texto que será utilizado em Ação Civil Pública a ser proposta pelo Sintepp contra a IN 01/2015 (não revisado).