O amor de Suzy por Dyana é comovente, a começar pelo nome de realeza que lhe atribuiu. Hoje saíram às duas horas da madrugada para cortar cuidadosamente o cabelo de Dyana, raspando-o em toda parte central e aproveitando para pintar de azul o resto do corpo. Ela ficaria linda da cor do céu tanto quanto Julio, a quem Fany sapecou-lhe um reluzente lilás. Na volta Suzy passou num man shop, afinal, precisaria alimentar sua afilhada: comprou quilos de sojas, vitaminas em comprimidos, sal, alho, cebola, produtos transgenicamente preparados para fazerem bem a Dyana. A saúde valia a pena. Nessa loja Dy conheceu vários de sua espécie, deitados em confortáveis quartos pouco maiores que seus corpos e observados por quem lhes pretendiam.
O carinho de Suzy realmente não tinha limites, queria ver Dyana sempre mais bonita, e achou por bem decepar o seu polegar, talvez os dois, com oito dedos nas mãos a aparência lhe seria bem melhor, além disso, não sentiria dor já que o procedimento contaria com doses suficientes de anestesia. A beleza valia a pena. O que importava é que deveria estar preparada para comemoração de seu aniversário, onde encontraria com suas outras amigas e amigos, em especial o Pool e seu fiel Leno.
Pool tinha verdadeira fascinação por Leno e com ele sempre dormia no quintal de casa, sempre abraçadinhos. Quando separados Pool chegava às lágrimas ao ver a foto de seu amigo na tela do celular. Leno era um fofinho, calmo, falava com a voz de criança apesar de adulto, não gritava e nem era agressivo, um gentleman. Resultado de mais uma prova de amor por parte de Pool, que havia carinhosamente extirpado seus testículos, porém, tudo sem dor e com muita sensibilidade. Ora – pensava Pool – para que alguém precisa de testículos?!
Na festa compareceram os convidados esperados. Cada um mais apresentável que outro. Sempre acompanhados, unidos, presos um ao outro por uma simpática e rígida corrente. Mário estava com as orelhas devidamente aparadas, seu companheiro lhe havia feito essa bela transformação: foram só quinze centímetros a menos, poderiam ser mais.
Alguns pintados, sem roupas, sendo exibidos com orgulho por seus respectivos companheiros. Era uma festa das mais prestigiadas.
Mas nem tudo é perfeito, havia os inoportunos protetores de humanos que criticavam estas belas festas, quase sempre beneficentes. Diziam – vejam só - que os seus animais companheiros - a quem taxavam de proprietários daqueles - não respeitavam a natureza dos pequenos e inofensivos humaninhos. Dos olhares meigos diziam serem de tristeza; os cantos agudos, angustia; e da calma, a depressão.
Que raça indigesta desses protetores! – resmungavam as madames animais - Amamos muito nossos humanos: raspamos e pintamos seus corpos, os mutilamos, para ficarem mais belos e adequados aos nossos padrões. Gostamos tanto deles que queremos que sejam nossa imagem e semelhança, por isso são considerados nossos melhores amigos, são queridos humaninhos domesticados. O amor valia a pena. E a festa continuou arrasando.
Walmir Brelaz
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